1.Em todos os níveis de ensino podem encontrar-se alunos com capacidades ou talentos excecionais. Estima-se em três a cinco por cento o número de crianças sobredotadas, diagnosticadas ou não, a frequentar as escolas portuguesas.
Para além da diversidade individual específica do ser humano, estas crianças apresentam características próprias que têm que ser tidas em consideração no panorama escolar. Os seus ritmos e estilos de aprendizagem ditam-lhes um particular modo de trabalho e de relação, que pode ter consequências negativas tanto no desenvolvimento pessoal e social, como na integração escolar e desempenho académico. A acrescer às diferenças do ponto de vista de interesses intelectuais, nível de vocabulário e desenvolvimento psicológico e social, surgem as dificuldades em ser aceite e compreendido pelos colegas e adultos.
2.O tema da sobredotação está rodeado de mitos que têm impedido a criação de melhores respostas educativas generalizadas. Entre eles destacamos o mais devastador: não é necessário o sistema educativo preocupar-se com tais alunos, pois que eles já são privilegiados e, havendo tanto insucesso escolar, numa escola inclusiva há que dar prioridade aos alunos portadores de deficiências, aos que têm dificuldade em aprender, aos que, de alguma forma, são desfavorecidos…
Todavia, segundo Monks (1997), as elevadas capacidades e os talentos superiores não garantem, por si só, o sucesso escolar esperado. Em muitos casos, a sobredotação é um presente envenenado, pois nem sempre estes alunos aprendem bem, nem sempre são os melhores, nem sempre estão motivados para as aprendizagens programadas para o grupo a que pertencem, nem sempre apresentam o comportamento social adequado, podendo passar despercebidos aos olhos dos professores ou ser apelidados de mal comportados ou desajustados. Daqui podem derivar atitudes ou agressivas ou retraídas que podem “mascarar” a boa dotação.
3.Os métodos de ensino são completamente inadequados para as inteligências superiores e as notas escolares não correspondem ao avanço intelectual real dos sujeitos mais brilhantes. Estes alunos, tal como todos os outros ditos “diferentes”, devem poder frequentar a escola num meio o menos restritivo possível, em ambientes inclusivos, mas neles tem de haver ensino individualizado e personalizado, que desenvolva capacidades de forma harmoniosa, de modo a responder às reais necessidades cognitivas e emocionais dos alunos (Serra, 2005).
4.De outra forma, corre-se o risco de pôr em perigo o seu desenvolvimento e realização como pessoas e prejudicar a própria sociedade, privando-a de elementos produtivos e podendo ajudar a criar marginais com capacidades superiores, tornando-se um problema de ordem social grave. Isto é, a escola, ao tornar-se fonte de fracasso de talentos e de perda de valores, pode ser geradora de elementos indesejáveis no tecido social.
Torna-se por isso candente a questão do atendimento escolar de qualidade dos alunos com sobredotação, porque ao não se salvaguardarem os seus direitos como alunos, como crianças e como pessoas, ao nivelar por baixo, uniformizando os métodos e estratégias em detrimento da formação dos talentos individuais, corre-se o risco de multiplicar o insucesso escolar e o risco de exclusão.
5.Foi comprovado que as crianças sobredotadas para quem se desenhou um programa educativo ajustado, tiveram melhores desempenhos académicos e sociais, com avanços mais rápidos. Colocamos como prioritária a questão: os currículos das escolas de formação de educadores de infância e professores preparam-nos para uma prática de diferenciação pedagógica, quanto aos alunos com incapacidades/dificuldades ou com capacidades excecionais?
A escola e os professores têm de modificar a sua atitude perante os alunos com mais capacidades e saberes, e tanto mais quanto mais variados forem os seus interesses e mais dispersas as áreas em que demonstrem talentos superiores. Há que saber compreender as suas necessidades e saber estruturar um programa educacional personalizado. Os professores e técnicos de educação, nomeadamente os que intervêm junto das idades mais precoces, têm de passar a ter a devida preparação para poder identificar, encaminhar, aconselhar e atuar. Na organização escolar tem de existir a estrutura responsável por uma educação diferenciada para alunos sobredotados.
Será o meu filho sobredotado? de Helena Serra e Ana Serra Fernandes | Porto Editora 2015
Este livro pretende, por isso, ajudar os pais a familiarizarem-se com o conceito de sobredotação e dar a conhecer formas de promover um desenvolvimento salutar, tanto afetivo como educativo. De certa forma, esperamos que possa também servir de alerta aos decisores políticos, dando-lhes a conhecer as necessidades particulares destas crianças.
Mesmo contando com o apoio das instituições, cabe-lhe a si, enquanto mãe ou pai, apoiar o crescimento do seu filho ou filha, encaminhando-o no sentido da felicidade.
Em Construção